Geral

Escândalo no TJMG

segunda-feira, 06/06/2011 20:30

Mais denúncias de irregularidades contra o desembargador Elpídio Donizetti

Matéria veiculada na edição de ontem (domingo, 5) do jornal Estado de Minas traz ao conhecimento do público mais irregularidades que teriam sido cometidas pelo desembargador Elpídio Donizetti Nunes, da 18ª Vara Cível do TJMG. Quando era presidente da Anamages (Associação Nacional dos Magistrados Estaduais), o desembargador, que atualmente é investigado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por ato de improbidade administrativa e crimes contra a administração pública, teria, inclusive, promovido curso de doutorado para magistrados que, ao final, não garantiu o certificado.

A seguir, a íntegra da matéria:

“Quando a Justiça se confunde com negócios

A revelação de que o pagamento de pensão alimentícia à ex-mulher foi negociado em troca de um cargo público no Tribunal de Justiça de Minas é apenas a ponta do iceberg da intrincada vida pública, sindical e privada do desembargador Elpídio Donizetti Nunes, da 18ª Câmara Cível. Hoje alvo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), onde

responde a processo administrativo por nepotismo, o magistrado é sócio da Faculdade Del Rey, o que é vedado pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), além de manter estreitas ligações com outras empresas, todas elas parceiras da Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages), fundada por ele em 2001 e sob sua presidência por 10 anos.

Um dos exemplos dessa híbrida convivência pode ser o contrato de aluguel que teria Donizetti como locatário de um imóvel no luxuoso Bairro Cidade Jardim, Região Centro-Sul da capital, assinado em 2001. Nele, o fiador é o próprio desembargador, entretanto, assinando como então presidente da Associação dos Magistrados Mineiros (Amagis), entidade que ele também presidiu. A irregularidade no caso é que o estatuto da Amagis impede o seu uso para esse fim. Não bastasse a pensão e o contrato, a exoneração de Fábio Antônio Klein da Silva do cargo de assistente judiciário no gabinete do desembargador, publicada quinta-feira no Diário Oficial do Judiciário, confirma mais um troca-troca entre o público e privado.

O servidor Fábio Antônio acumulava até março o expediente no gabinete de Donizetti com o de próspero empresário. Ele era sócio fundador da empresa Aprobatum – Centro Nacional de Qualificação de Pessoal Ltda., com fins lucrativos, e do Iunib – Instituto Universitário Brasileiro Ltda., com sede no mesmo edifício da Rua Araguari, 358, no Barro Preto. E apesar de ser subordinado do magistrado, contou com a ajuda dele para tocar o negócio da área de ensino.

Em uma publicidade da Livraria Aprobatum, ligada ao curso, o desembargador aparece assinando uma simulação de cheque que oferece 50% de desconto àqueles que o apresentassem na compra de material didático. Abaixo da assinatura do magistrado garoto-propaganda, aparece a informação: “Prof. Elpídio Donizetti – Coordenador do Curso Aprobatum”.

Segundo registros públicos, quando deixou o quadro societário do Iunib,o ex-assessor foi substituído por uma pessoa bem próxima ao magistrado: sua mulher Jussara Donizetti de Souza Nunes, que teria 90% das cotas da empresa. A saída de Fábio,em21 de março de 2011, se deu no mesmo dia da entrada de Jussara. A troca no quadro societário, que deixou tudo em família novamente, não deve afetar a situação do “empregado” do Iunib, desembargador Elpídio Donizetti, contratado como professor de direito civil dos cursos de pós-graduação.O magistrado, com boas relações como ex-assessor, além de coordenador do curso Aprobatum, conforme o panfleto publicitário, também foi contratado por ele para compor o quadro docente da instituição.

 Desprezo

 De acordo com o artigo 36 da Lei Orgânica da Magistratura, é vedado ao magistrado “exercer cargo de direção ou técnico de sociedade civil, associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe, e sem remuneração”. Proibição que não teve força para frear a atuação do desembargador, que desprezou ainda o primeiro impedimento previsto na lei: “Exercer o comércio ou participar de sociedade comercial, inclusive de economia mista, exceto como acionista ou cotista”. Segundo registro da Junta Comercial de Minas,o magistrado é sócio da Uesmig – União de Ensino Superior de Minas Gerais Ltda., que tem o nome fantasia de Faculdade Del Rey, com sede na Rua Ubá, 396, Bairro Colégio Batista. A faculdade foi aberta em agosto de 2001.

 Além dos registros públicos, Ivagner nunca escondeu de ninguém o orgulho de ter Elpídio Donizetti no quadro societário da empresa. Em 2009,em entrevista a um jornal mineiro, Ivagner considerou como um dos trunfos da administração das Faculdades Del Rey “seus três sócios que atuam diretamente no dia a dia da instituição, funcionalmente com setores estruturados no acadêmico, administrativo-financeiro e marketing e vendas”. E o texto ressalta também: “Os três (sócios) têm currículos para a posição que ocupam. Gustavo Magalhães é formado em direito, mestre e doutorando em direito, professor, empresário e procurador do município. Elpídio Donizetti é mestre em direito e desembargador e Ivagner Ferreira tem formação em ciências contábeis, pós-graduado em consultoria e marketing”, entre outros títulos.

 Entenda o caso

 – O Sindicato dos Servidores do Tribunal de Justiça de Minas (SINJUS) entra com representação no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra o desembargador Elpídio Donizetti por prática de nepotismo. Em 15 de outubro de 2010, ele nomeou sua ex-mulher, Leila Nunes, servidora efetiva do TJ, ao cargo comissionado de assessora, com salário de R$ 9,2 mil

 – Para se defender da acusação, o desembargador informa ao CNJ estar separado de Leila. Para comprovar a informação, o conselheiro pede o termo de separação ao TJ de Minas e descobre nele uma cláusula que prevê a isenção do pagamento de pensão à ex-mulher durante o período em que ela ocupar o cargo de assessora.

 – O relator do caso entende que a “atuação do desembargador que entrelaça sua vida particular com sua posição como membro do Tribunal de Justiça mineiro ofende frontalmente a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman)”. Ele foi acompanhado pelos demais conselheiros por unanimidade.”

 Doutorado sem título

A parceria da Anamages, entidade à época presidida pelo desembargador Elpídio Donizetti, e o curso Aprobatum, coordenado por ele, que funcionam no mesmo endereço, não rendeu bons frutos para cerca de 50 juízes brasileiros que se inscreveram para fazer o curso de doutorado, durante as férias de julho e janeiro, na Argentina, oferecido pelas entidades. Todos os magistrados assinaram contrato de prestação de serviço com a Anamages para, por 15 dias, freqüentar as aulas na desconhecida Universidad Del Museo Social Argentino, mediante o pagamento de 25 prestações, no valor de R$ 910,35, para ter o título de doutor. Depois da formatura, entretanto, surgiram as dores de cabeça, porque a escola argentina não é reconhecida pelas autoridades de educação daquele país, o que inviabilizou também o reconhecimento do diploma no Brasil. Quem obteve o título teve que recorrer à Justiça.

E teve mais. Ao chegarem à instituição argentina para iniciar o curso, os juízes comprovaram que o custo do curso era de pouco mais de R$ 300 mensais e eles estavam apagando mais de R$ 910,ou seja, R$ 600 apenas pela intermediação da Anamages com a universidade. “Ficamos muito revoltados com a descoberta e obrigamos a entidade a fazer uma renegociação nos contratos. O valor caiu para R$ 500, o que consideramos aceitável”, conta um magistrado,que não quis se identificar e guarda em uma gaveta,  como amarga lembrança, seu título de doutorado. “A entidade estava ganhando R$ 2 milhões apenas pela indicação da escola argentina. Ela não passa de um caça-níquel”, diz revoltado.

Ofício

A renegociação dos contratos ficou clara em ofício encaminha do para todos os juízes inscritos no curso pela diretora financeira da Anamages, Lurdes de Freitas. O texto diz: “Em razão da menciona da flexibilização do convênio, o valor do curso de doutorado será reduzido em R$ 10.942,20, o que corresponde a 12 parcelas de R$ 910,35”. Além disso, declara a relação umbilical da Aprobatum com a Anamages, ao afirmar: “Afim de podermos concretizar a renegociação, solicitamos o seu comparecimento à secretaria da Anamages/Aprobatum, na rua Araguari,358, Barro Preto”. 

O curso teve início em julho de 2007 e se entendeu durante as férias de 2008 até janeiro de 2009. Os juízes eram obrigados a cumprir uma carga horária de 15 dias de aulas e puderam complementar os créditos com a apresentação da tese. Como aquelas letras miúdas de contratos draconianos, o folder traz uma informação que só foi interpretada devidamente quando começaram a surgir os problemas.

Nele, o curso Aprobatum se antecipa e coloca à disposição dos magistrados seu departamento jurídico. No item intitulado “Admissão do título perante as instituições brasileira”, os promotores do curso afirmam: “O Decreto nº 5.518, de 23 de agosto de 2005,do presidente da República Federativa do Brasil, prevê a admissão do título de doutor perante as instituições brasileiras. Caberá ao detentor do título providenciar o respectivo registro, tendo à disposição, sem custo adicional, a assessoria do departamento jurídico do Aprobatum”.

Fonte: Jornal Estado de Minas